Não vou mentir. Queria hoje fazer um belo texto de homenagem a um grande homem, mas o dia foi longo e agitado e o cérebro não pode mais do que aquilo que vai sair. Li pela segunda vez um livro sobre esse grande homem, e terminei-o há dias. No final das páginas as lágrimas cairam-me, a mim que sou adversa a elas, pela coragem com que lutou contra a doença, pelo sofrimento que lhe causou despedir-se de algo que ele amava, a vida. O homem de que falo faz parte dos meus poucos mas valiosos ídolos, e é conhecido como o capitão Salgueiro Maia.
Foi ele que deu origem a uma revolução sem sangue, que nos livrou duma ditadura maldita, um fechar de boca e de liberdades incalculáveis e nas quais eu não saberia viver. Ou viveria, presa numa qualquer cela, sem conseguir expressar tudo o que ia pela minha cabeça. Essa é cada vez mais a minha forma de viver, não nos vale de nada não dizermos aquilo que nos vai cá dentro, à excepção dos proibidos sentimentos que só cabem ao coração.
Ele era um militar de uma bravura incalculável, que não pensou duas vezes em morrer para nos dar liberdade, o direito ao voto, à igualdade. Quem o conheceu reconhece que mais ninguém sabia melhor mobilizar as tropas, convencer os incrédulos, ser optimista naquilo em que acreditava. Viveu e lutou por uma revolução, num dia que não deverá ter sido nada fácil mas que correu bem. No final descartaram-no, mandaram-no para longe do seu posto de trabalho porque ele falava demais, e falava daquilo que ninguém queria ouvir. Falava porque era para isso que tinha lutado, mas no fundo, talvez tenha lutado por uma utopia ou por um Portugal que ainda não nasceu. Um Portugal de igualdade, de trabalho, desenvolvimento, solidariedade, conjugados com muita alegria e divertimento... não apenas dos políticos mas também do povo. E talvez o povo ainda não estivesse e ainda não esteja preparado para isso.
Quem o conheceu também diz que não tinha um feitio fácil. Era teimoso, e tinha de levar avante aquilo que pensava. E levava. Era ele quem organizava as inúmeras viagens que fez com os amigos, e organizava-as ao milímetro, nenhum pormenor lhe escapava e se alguém ousasse dizer que havia uma melhor opção, ele amuava, e tinha de ser feito como ele queria. Mas mesmo assim todos o adoravam. Porque era íntegro, verdadeiro, especial. Não tinha medo de nada, amava a vida e todos os que o rodeavam. Não estava com ninguém só para conseguir algo, se estava era porque gostava da pessoa. Não perdia tempo com ninguém que não valesse a pena. E há tantas mais coisas para dizer sobre ele. Tantos mais livros para ler. Quem sabe um dia, antes de realizar o meu primeiro sonho de escrever um livro sobre uma estrela grunge, não escreva um livro sobre este homem que adorava ter conhecido e ter tido como melhor amigo. Segundo contam ele tinha todas as qualidades que eu adorava conhecer em alguém que quisesse ser meu melhor amigo, namorado, vizinho ou colega de corridas de cavalos. Alguém! Mas duvido que ainda hajam pessoas assim. Conheço uma no Porto, um Miguel muito especial, que só lhe falta fazer uma revolução. Em mim já fez e na minha paixão pelo jornalismo, e acredito que também já tenha feito outras revoluções na cabeça de outras pessoas.
Hoje é o dia do Salgueiro Maia. Cujo nome não ouvi hoje nos inúmeros discursos no Parlamento. Talvez por já ter morrido. Talvez por não se ter metido em bicos dos pés depois da revolução. Talvez porque não gostava de famas, e era humilde demais para ter achado que tinha feito algo glorioso. Para mim fez. E é o meu herói português. Ou um dos mais importantes. Obrigado pela liberdade. Obrigado pelo direito ao voto (mesmo que seja nulo irei sempre votar pelo respeito que tenho a este Senhor). Só tenho pena que muitos jovens, crianças e mesmo adultos não saibam quem ele é, a importância que tem na construção do Portugal que temos hoje. Tenho mesmo muita pena, e ainda hei-de pensar numa forma de diminuir esta falta de cultura pelo importante e apresentar uma solução a quem de direito. Hoje vou dormir sobre o assunto.
Hoje, e sempre, viva o Salgueiro Maia! Esteja onde estiver, que esteja feliz porque há muitos que se orgulham do seu feito maravilhoso e lhe agradecem por isso todos os dias. Um texto melhor há-de nascer um dia em que esteja menos cansada, prometo.
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