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Gritos de revolta

Gosto do Tibete e dos tibetanos. São homens e mulheres a lutar pela sua independência, de cultura, de país, de religião, de língua e, sobretudo, de alma. Homens e mulheres a lutar pela não repressão, liberdade de expressão, por um país que é deles mas que não lhes pertence. São homens e mulheres abafados pelas armas dos repressores, de olhar perante as câmaras a pedir ajuda num lamento semelhante ao último respirar de uma vida. E as suas vozes soam a cada instante nas nossas mentes, ou pelo menos em algumas. Pedem ajuda porque sabem que sozinhos não conseguem evaporar as armas que lhes estão apontadas diariamente. Porque sabem que unidos temos o poder de acabar com a invasão de um país merecedor da sua identidade e liberdade. Porque sabem que os seus sentimentos são semelhantes a todas as aves presas numa gaiola, sem oportunidade de soltar um piu. E há tantas assim por este mundo fora...

Não foram apenas os monges os revoltosos, mas milhares de pessoas, de todas as idades, vindos de muitas localidades vizinhas. Uma multidão que segurou convictamente a bandeira do seu país, roubado, e cantou por uma liberdade tão distante. A posse de bandeiras tibetanas é proibida e frases como "Viva o Tibete livre!", "Liberdade de expressão", "Abaixo a esterilização das nossas mulheres!", "Não toquem nas montanhas sagradas e nas minas do Tibete!", também não são aceites. Não tiveram medo e enfrentaram o proibido, até que a morte ou a repressão os calou!

Lhasa, essa cidade que suspiro por conhecer, está agora diferente. De há três semanas para cá ficou silenciosa com tanques e chineses armados em cada esquina, interdita a todos os jornalistas, sem ONG, com regras claras e duras que não deixam sair ninguém de casa ou abrir a boca para dizer uma palavra, perseguições ao rubro, muito medo, e muitas prisões de quem espera por um país seu. Uma cidade muralha, de pensamentos e acções.

Ouvi há dias um debate na SIC Notícias, com uma "gaja qualquer" a fazer a apologia de uma China perfeita. Incrédula senti ganas de ir para lá e conhecer o verdadeiro Tibete e a verdadeira China, para a acusar de inverdades. Mas não foi preciso... alguém da Amnistia Internacional telefonou para a estação de televisão a acusar a "gaja qualquer" de apenas ter números chineses e de não conhecer a realidade nua e crua. E deitou-a por terra. Na resposta à chamada, a "gaja qualquer", com um tom de voz trémulo e sem certezas, admitiu que os números eram chineses, e no meio da conversa também admitiu que tinha vivido 3 anos na China. Sabe-se lá a fazer o quê, a trabalhar para quem... e mais nem quero comentar. Mas são e foram estas informações que nos foram chegando ao longo dos anos, são estas pessoas as convidadas a comandar um debate numa estação de televisão noticiosa e, consequentemente é assim que a realidade foi sendo construída.

Jogos Olímpicos são desporto e não política
É a frase feita dos dias de hoje. Há falta de soluções para o problema, medo de boicotar um dos mais importantes acontecimentos de um dos países mais ricos, medo de clamar por uma conversa. Quando em muitos anos passados, nunca houve tempo ou disponibilidade para se sentarem à mesa a trocar ideias e opiniões, mas houve tempo de crítica e acusação de líderes pacíficos, de sempre, de provocarem os motins e o clima de crispação. Esquecendo-se de que o povo também está revoltado e nao precisa que ninguém os mande para a rua, quando o seu desejo primogénito é fazê-lo.

E Portugal? O que podemos fazer? Podíamos agir com consciência. Em primeiro lugar porque a situação do Tibete é bastante semelhante à colonização de Timor pela Indonésia há uns anos atrás e na altura, gostámos de ter uma ajudazita internacional. E para além disso, devíamos também ajudar esta pobre gente a clamar por independência, porque vivemos num regime fascista não há muito tempo, em que a liberdade era a palavra proibida, deveríamos lutar por essa mesma liberdade em qualquer canto do mundo. Como este.

Mas estamos exactamente a fazer o inverso, com Durão Barroso (esse português corajoso que nos abandonou a todos) na ponta da barricada, o Governo a bater palmas e o PCP a segurar bandeiras. Comunistas por comunistas há que ter cabeça para pensar, meus senhores! Que vergonha que sinto...!

O boicote aos jogos não é solução porque há atletas que sonham com eles há muito tempo. E quem somos nós para derrubar os sonhos de alguém? Mas o boicote dos líderes políticos à cerimónia de abertura ou a uma simples ida aos Jogos Olímpicos, parece-me uma boa ideia. Ou excelente ideia, até porque os Jogos Olímpicos significam desporto e não política, e por isso não é necessária a presença dos políticos, apenas dos desportistas. Certo?

P.S.: E o massacre da Praça de Tiananmen, já foi totalmente esquecido? Foram mortos mais de mil manifestantes desarmados. Na altura não foi um número suficientemente forte para desencadear algum tipo de reacção, mas e hoje, quantos vão ser precisos?

P.S.1: Vale a pena ver este vídeo da Reuters, que mostra um monge em lágrimas pela certeza de uma vida durável apenas nas próximas horas. E pelas mentiras veiculadas pelos meios de comunicação social que lhe merecem uma grande revolta. As notícias dão conta de que os manifestantes não vivem muito tempo depois de exprimirem o que lhes vai na alma.

P.S.2: E ainda existem repórteres (pessoas!) com "tomates". Três jornalistas, um deles o secretário-geral dos Repórteres sem Fronteiras, conhecido por ser um defensor acérrimo da liberdade de expressão,interromperam o discurso do presidente da comissão organizadora chinesa na cerimónia simbólica em Olímpia, onde se acendeu a tocha olímpia. Seguravam uma bandeira negra, com algemas ao invés dos anéis olímpicos e a mensagem "Boicotem o país que espezinha os direitos humanos!". Mas direitos humanos, o que é isso?

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