Nem sempre gosto de andar de autocarro. Por vezes sinto-me sufocada por tão exímio espaço. Outras há em que as conversas paralelas são engraçadas e/ou encontramos pessoas deliciosas de se ouvir. Na minha última viagem aconteceu isso mesmo.
"É só gabarolas. Compram um carro grande e depois não o sabem conduzir! Ah! Ah! E andam de carrinho porque ainda estamos no início do mês. Daqui a uma semana já andam de autocarro e dão batatas fritas e ovos estrelados aos filhos, em vez de os levaram aos Mcdonald's. Este país é uma fantochada e algumas pessoas ainda são piores."
(Depois de se levantar e topar que era uma carrinha Mercedes, a conversa era diferente) "Ela não tem pressa para tirar dali o carro porque não tem de chegar a casa e preparar o jantar. Deve ter os pratinhos já todos na mesa, e a empregada já preparou a comida. E a mulher não se mexe mesmo, será que quer que eu lhe vá lá tirar o carro? É que eu vou, mas ainda lhe dou uns tabefes por não ter respeito pelas pessoas que vão aqui dentro!" (Isto dito bem alto. O motorista, com as mãos na cabeça e a tentar respirar fundo para não explodir, teve a sensatez de não abrir a porta do autocarro ou sabe-se lá o que podia ter acontecido).
(A senhora demorou uns bons 5 minutos a tentar tirar o carro da curva e não conseguindo, o que é inacreditável porque tinha imenso espaço, o autocarro teve de fazer marcha atrás e mais uma data de manobras!) E no resto da viagem pensei nas palavras daquele "velhote". Não era sociólogo ou psicólogo, ou outra coisa qualquer, não tinha mestrados ou doutoramentos mas sabia bem como tudo funcionava. Frequentou a melhor escola, a da vida e não tinha papas na língua. Não disse nada de mais, mas disse-o e com todas as sílabas que a mensagem tinha. Sem medos ou freios de qualquer espécie. Não se importando com os olhares reprovadores e alguns sorrisos mais maliciosos, sentidos dentro do autocarro. Não tinha nada a perder. O máximo que lhe podia acontecer era ser expulso do veículo e jantar mais tarde. De resto... nada!
E nesse mesmo dia, mais cedo, num outro autocarro, uma senhora, também velhota, fazia a radiografia à sociedade actual, sobretudo aos mais novos. "É uma juventude perdida, já não têm educação e respeito por ninguém e muito menos pelos mais velhos. Imagina lá quantas vezes ia sendo atropelada à porta de casa? Ou que chego a um autocarro e ninguém se digna a levantar-se para me dar lugar? Ou acha que alguém me ajuda com as compras do supermercado? Já ninguém ajuda ninguém, às vezes nem as pessoas da nossa família. No tempo do Salazar é que era. Não havia assaltos, faltas de respeito, as pessoas não se matavam umas às outras. Havia mais educação, sobretudo na juventude. Era tudo muito diferente." Empalideci e temi por esse regresso. Escusado será dizer que ela também era uma corajosa ou inconsciente, visto estarem dois jovem à sua frente.
São destas pessoas que Portugal precisa. Sem medos ou papas na língua. Que o digam, com respeito e responsabilidade, mas que digam o que pensam, e o que, na verdade, todos nós pensamos mas por vezes temos medo de admitir! E que não tenham medo de lutar e vencer. E não vencer apenas por si próprios, mas também pelos outros. Sozinho ninguém vive. Produzir, ser capaz, trabalhar em grupo, lutar muito e sem medo, organizar, incentivar, libertar e ser feliz! O país e o povo! Todos, todos!
P.S.: Já há algum tempo ouvi uma outra conversa de autocarro. Apenas uma frase me ficou na cabeça, soando de vez em quando, quando entro num veículo semelhante ou quando vejo determinadas notícias. Rezava assim: "Sim, o médico disse-me que eu precisava urgentemente de óculos porque o problema podia piorar. Mas o dinheiro não deu nesse mês, e nem no seguinte e este mês não esticou e ainda não dá para tudo. Talvez para o próximo." Há ladainhas piores, pois há!
Um velhote. Sóbrio. E uma senhora de Mercedes poisada em plena curva apertada, dificultando ou impossibilitando a passagem do autocarro, que de pequenino não tem muito. (Mas quem se lembra de colocar um carro numa curva para deixar passar um autocarro??) Ora, encafuou o automóvel e ninguém andava, para a frente ou para trás. E começaram as investidas do senhor "velhote".
"É só gabarolas. Compram um carro grande e depois não o sabem conduzir! Ah! Ah! E andam de carrinho porque ainda estamos no início do mês. Daqui a uma semana já andam de autocarro e dão batatas fritas e ovos estrelados aos filhos, em vez de os levaram aos Mcdonald's. Este país é uma fantochada e algumas pessoas ainda são piores."
(Depois de se levantar e topar que era uma carrinha Mercedes, a conversa era diferente) "Ela não tem pressa para tirar dali o carro porque não tem de chegar a casa e preparar o jantar. Deve ter os pratinhos já todos na mesa, e a empregada já preparou a comida. E a mulher não se mexe mesmo, será que quer que eu lhe vá lá tirar o carro? É que eu vou, mas ainda lhe dou uns tabefes por não ter respeito pelas pessoas que vão aqui dentro!" (Isto dito bem alto. O motorista, com as mãos na cabeça e a tentar respirar fundo para não explodir, teve a sensatez de não abrir a porta do autocarro ou sabe-se lá o que podia ter acontecido).
(A senhora demorou uns bons 5 minutos a tentar tirar o carro da curva e não conseguindo, o que é inacreditável porque tinha imenso espaço, o autocarro teve de fazer marcha atrás e mais uma data de manobras!) E no resto da viagem pensei nas palavras daquele "velhote". Não era sociólogo ou psicólogo, ou outra coisa qualquer, não tinha mestrados ou doutoramentos mas sabia bem como tudo funcionava. Frequentou a melhor escola, a da vida e não tinha papas na língua. Não disse nada de mais, mas disse-o e com todas as sílabas que a mensagem tinha. Sem medos ou freios de qualquer espécie. Não se importando com os olhares reprovadores e alguns sorrisos mais maliciosos, sentidos dentro do autocarro. Não tinha nada a perder. O máximo que lhe podia acontecer era ser expulso do veículo e jantar mais tarde. De resto... nada!
E nesse mesmo dia, mais cedo, num outro autocarro, uma senhora, também velhota, fazia a radiografia à sociedade actual, sobretudo aos mais novos. "É uma juventude perdida, já não têm educação e respeito por ninguém e muito menos pelos mais velhos. Imagina lá quantas vezes ia sendo atropelada à porta de casa? Ou que chego a um autocarro e ninguém se digna a levantar-se para me dar lugar? Ou acha que alguém me ajuda com as compras do supermercado? Já ninguém ajuda ninguém, às vezes nem as pessoas da nossa família. No tempo do Salazar é que era. Não havia assaltos, faltas de respeito, as pessoas não se matavam umas às outras. Havia mais educação, sobretudo na juventude. Era tudo muito diferente." Empalideci e temi por esse regresso. Escusado será dizer que ela também era uma corajosa ou inconsciente, visto estarem dois jovem à sua frente.
São destas pessoas que Portugal precisa. Sem medos ou papas na língua. Que o digam, com respeito e responsabilidade, mas que digam o que pensam, e o que, na verdade, todos nós pensamos mas por vezes temos medo de admitir! E que não tenham medo de lutar e vencer. E não vencer apenas por si próprios, mas também pelos outros. Sozinho ninguém vive. Produzir, ser capaz, trabalhar em grupo, lutar muito e sem medo, organizar, incentivar, libertar e ser feliz! O país e o povo! Todos, todos!
P.S.: Já há algum tempo ouvi uma outra conversa de autocarro. Apenas uma frase me ficou na cabeça, soando de vez em quando, quando entro num veículo semelhante ou quando vejo determinadas notícias. Rezava assim: "Sim, o médico disse-me que eu precisava urgentemente de óculos porque o problema podia piorar. Mas o dinheiro não deu nesse mês, e nem no seguinte e este mês não esticou e ainda não dá para tudo. Talvez para o próximo." Há ladainhas piores, pois há!
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